30.11.04

A COMUNICAÇÃO SOCIAL NUMA DEMOCRACIA LIBERAL



Após o 25 de Abril, foram nacionalizados inúmeros órgãos de comunicação social, os quais se mantiveram em tal situação até ao período do chamado cavaquismo, quando todos os jornais estatais foram privatizados e surgiram rádios e televisões também privadas.

Hoje, não há força política que defenda a renacionalização daqueles órgãos. Toda a gente fala da independência da comunicação social face ao poder.

Em meu entender, todos os jornais, rádios e televisões deverão ser privados. O próprio serviço público deverá ser assegurado por canais de TV e rádios independentes, mediante contratos estabelecidos com o Estado.

Mas para a imprensa ser verdadeiramente independente, não basta estar nas mãos de empresas particulares ou até cooperativas, como mostrou, recentemente, o "caso Marcelo Rebelo de Sousa".

Um ministro, em linguagem desbragada, atacou um seu companheiro de partido por criticar o poder executivo do qual faz parte nas suas análises semanais na TVI, às quais assistiam, em média, cerca de 1 milhão de pessoas. Seguidamente, o presidente da administração daquela estação televisiva tem uma conversa com Marcelo Rebelo de Sousa, na qual, segundo este, o terá aconselhado a moderar as críticas ao governo, devido a negócios daquela estação com empresas e organismos dependentes do Estado.

Porque o conhecido professor universitário, segundo disse, não aceitou tal forma de censura, deu por concluida a sua análise que durava desde meados de 2000.

Estes factos mostram a dependência de muitas empresas do Estado e o receio de enfrentarem o poder, o que prova não existir uma sociedade civil suficiente e devidamente forte, à semelhança de sociedades liberais, como a americana ou a inglesa, onde o poder político tem um carácter regulador da activiadde económica, intervindo muito excepcionalmente e apenas nas tarefas que as empresas privadas e os cidadãos não puderem levar a efeito.

Consequentemente, as pessoas e as empresas não têm medo de enfrentar o Estado.

O mais chocante são as afirmações de responsáveis do PSD, como Pinto Leite ou o número dois do governo, Álvaro Barreto, achando normal as empresas terem receio de incomodar o poder.

Dessas afirmações podem extrair-se duas conclusões:

1ª - Este não é o PSD fundado por Sá Carneiro: um partido central e reformista, defensor da liberalização económica acompanhada de forte componente social, mas um partido de direita e, em muitos aspectos, colonizado pela direita radical, representada pelo actual CDS e o seu chefe, Paulo Portas.

2ª - Este governo não é liberal ou "neo-liberal", como gostam de afirmar os partidos da oposição.

Arranjem outra etiqueta para o executivo, chamem-lhe, por exemplo, "governo de direita conservadora e proteccionista".

Como se não bastasse aquele caso, o governo actual nomeou para a liderança dos órgãos de comunicação social ligados à PT, que controla através de "golden share", o mais santanista que Santana, Luis Delgado. Entre aqueles órgãos incluem-se o "Diário de Notícias", o "Jornal de Notícias", o "24 Horas", ou a TSF. Aliás, a substituição de Fernando Lima na direcção do "Diário de Notícias" foi do que mais rocambolesco se viu até hoje neste País.

Concordamos com as propostas do líder socialista José Sócrates quanto ao relacionamento do poder com a imprensa. Recordamos, no entanto, que a PT passou a integrar na sua holding todos aqueles órgãos por acção do governo de António Guterres, do qual o mesmo Sócrates fez parte. E, na altura, também existiu manipulação, embora mais subtil do “Diário de Notícias”.

Por Manuel Silva

(Publicado no jornal "TERRAS DE BAROSO", de Novembro de 2004)