24.12.04

OS HOMENS QUE NÃO FORAM MENINOS



Nos anos 40 do século passado, o escritor neo-realista e dirigente do PCP, Soeiro Pereira Gomes, publicou o livro "Os Esteiros" - que dedica a todos os homens que não foram meninos - sobre as duras condições de vida de crianças sujeitas ao trabalho infantil, em fábricas da indústria cerâmica, no Ribatejo daquele tempo.

Jerónimo de Sousa, actual líder do mesmo partido, foi um desses homens, pois começou a trabalhar aos 14 anos, como operário, quando deveria estar na escola. Essa situação e todas as circunstâncias em que foi criado levaram-na à opção pelo PCP e estão na origem da sua ortodoxia.

No mundo inteiro, muitos trabalhadores e intelectuais bem intencionados efectuaram a mesma opção ideológica. No entanto, em nome do paraíso terreno, o comunismo criou um autêntico inferno, tendo acabado em quase todos os países em que foi implantado. Mais que uma utopia, foi um embuste e uma tirania.

O capitalismo democrático, regulado pelo Estado de direito é que melhorou significativamente as condições de vida dos operários e demais trabalhadores.

No entanto, há meninos que não sabem o que é ser criança, como Jerónimo de Sousa e tantos outros meninos de gerações anteriores e posteriores à sua no Ribatejo e outras localidades do nosso país. Há muitos milhões de crianças (e também de adultos) a morrer à fome. Há muitos milhões de homens e mulheres que não só não foram meninos como não vêem a sua dignidade ser respeitada.

Como dizia um texto publicado na "Gazeta da Beira" há uns bons 20 anos, o Natal ainda não é de todos. No nosso País e na nossa região, nas últimas décadas a situação social mudou muito e para melhor. No entanto, ainda há muita criança e muito adulto, especialmente os sem-abrigo, para quem esta quadra não é festiva.

Como dizia, há alguns anos, o então bispo de Setúbal, D. Manuel Martins, "um governo que não combate a pobreza e a miséria é um governo imoral". Procuremos, políticos e sociedade civil, iniciar o caminho do futuro por esta gente. Lembremo-nos dela pelo Natal, mas recordemos uma passagem de uma música do padre Zezinho: "tudo seria bem melhor se o Natal não fosse um dia". Que também para os pobres e miseráveis o sol brilhe e possa ser Natal todos os dias. Foi, além da expiação dos pecados dos homens, para isso que Cristo veio ao mundo, nasceu e viveu pobre. Para nos dizer que a riqueza e a pobreza são morais e que a riqueza deve ser criada, mas também usufruida por todos.

Os liberais foram os vencedores das últimas décadas, porque diminuiram e muito a pobreza e a miséria. Se são capazes ou não de combater as condições sociais degradantes ainda visíveis, embora minoritárias, no mundo desenvolvido, e maioritárias em muitos países do terceiro mundo, eis o grande desafio que se lhes coloca na era da globalização.

A todos um feliz Natal.

Por Manuel Silva