O governo mais à direita após o 25 de Abril surge com uma linguagem parecida à da esquerda mais tradicional. Só lhes falta dizer "abaixo o capitalismo", coisa que nenhum socialista afirma nos dias de hoje.
Como afirma o liberal, admirador de Margareth Thatcher e Ronald Reagan, Mário Vargas Llosa, "o capitalismo mostrou-se o sistema mais eficaz no que tange ao desenvolvimento científico e tecnológico e mais capaz de criar riqueza. No entanto, só por si, é um sistema amoral e injusto".
Aquele escritor peruano diz ainda ser o capitalismo apenas um sistema económico e não uma ideologia, tendo permitido uma melhoria significativa da vida da generalidade dos cidadãos quando regulado pelo Estado de Direito. Em sua opinião, o liberalismo é a síntese entre capitalismo, liberdade e democracia, devendo o Estado de direito democrático regular o sistema capitalista, assegurando a concorrência.
Ainda no mesmo artigo em que foca aquelas questões, publicado no "El País", de Espanha, Vargas Llosa mostra-se preocupado com o avanço do capitalismo selvagem, o qual poderá corromper e destruir as democracias, e com a constatação de que há multinacionais a mandar mais que alguns governos ou mesmo a controlar tais governos. Preocupações parecidas têm sido afirmadas pelo Papa João Paulo II.
Curiosamente, nunca se viu o Pedro e o Paulo preocuparem-se com tais questões. Ambos se afirmam cristãos. Mas, para o ser, não basta ir à missa e rezar para a fotografia...
Porque nunca denunciaram empresários quando não pagavam salários aos operários e compravam Ferraris, como aconteceu no Vale do Ave? Porque nunca os vimos apelar à globalização da solidariedade, a par da globalização económica, como apela também João Paulo II? Porque ficam mudos e quietos perante certas "deslocalizações" selvagens de multinacionais, lançando famílias (que tanto trazem na boca) de trabalhadores na miséria? É ou não verdade terem feito cedências à banca no tocante a impostos aquando da aprovação do OGE?
Por momentos, cheguei a pensar ter voltado a militar num partido dirigido por um destacado marxista, embora muito mais limitado política e culturalmente que o grande educador, cuja educação rejeitei...
Voltando a falar a sério: é evidente que o Pedro e o Paulo não viraram à esquerda. Aquelas afirmações acerca dos poderosos devem-se a mera demogogia que já não engana ninguém minimamente lúcido e ao facto de os agentes económicos verem nos mesmos total incompetência em potenciar políticas desenvolvimentistas, sem as quais, aliás, é impossível melhorar a situação social dos menos favorecidos.
Por Manuel Silva