Por Manuel Silva
Nos recentes referendos sobre a Constituição Europeia realizados em França e na Holanda, o "não" obteve duas importantes vitórias.
Aquele resultado mostra que se tem avançado demasiado depressa, nas costas dos cidadãos e pondo em causa a soberania nacional, na construção europeia. O federalismo mostra não ter pernas para andar.
Tal não significa, porém, o fim do projecto europeu iniciado no pós-segunda guerra mundial, consubstanciado mais recentemente na UE, no seu alargamento a leste e na moeda única. Há que prosseguir tal caminho, tendo em conta a vontade dos cidadãos, rejeitando o federalismo e defendendo o que De Gaulle chamava "a Europa das Pátrias, do Atlântico aos Urais", conciliando o ideal europeu com as soberanias nacionais.
Como disseram Cavaco Silva e Tony Blair, entre outros políticos empenhados no aprofundamento da UE, é melhor parar o processo referendário e reflectir sobre esta matéria. Não faz, pois, sentido a realização do referendo previsto em Portugal.
Por outro lado, muitos dos votantes do "não" fazem-no com receio da globalização, da concorrência e da reforma do modelo social europeu. Ou seja, votaram defendendo uma "Europa" cada vez mais desactualizada face aos novos desafios, que regista fraco crescimento económico e elevado desemprego. Há que ter a coragem, especialmente entre as forças não socialistas, ainda maioritárias nas instituições democráticas nacionais e europeias, de esclarecer os cidadãos de que se querem ver as economias cresceram, com mais emprego e melhores salários, os impostos terão de baixar significativamente, para atrairem investimentos, o que não será possível sem a substituição do Estado-Providência, como foi concebido há mais de meio século, por um Estado solidário e a complementaridade pública/privada, no plano social.
O mal não está no liberalismo, mas no excesso de proteccionismo. Na Inglaterra, com uma "esquerda" liberal, a economia cresce muito mais e o desemprego é muito menor que na França, governada por uma "direita" proteccionista. Seria bom que muitos anti-liberais primários reflectissem nesta realidade que se impõe aos seus lirismos.