Título original: Blame It on Fidel
De: Julie Gavras
Com: Nina Kervel-Bey, Julie Depardieu, Stefano Accorsi
Género: Dra
Classificação: M/12
FRA/IRL, 2006, Cores, 99 min.
Em 1970, Anna tem 9 anos. Para ela, a vida é simples e decorre confortavelmente entre Paris e Bordéus, entre a escola religiosa e a casa dos seus pais, Marie e Fernando, e a quinta vitícola dos seus avós maternos. A única mancha negra neste quadro perfeito é o tio que luta em Espanha contra o regime de Franco. Um comunista de que não convém falar-se. Mas rapidamente esta vida ordeira se complica, com a prisão do tio e uma viagem ao Chile em que Marie e Fernando manifestam os seus ideais políticos. Acontecimentos sobre os quais Anna, demasiado nova, não percebe a importância mas que mudam por completo a vida dos pais e a sua estabilidade.
"Costa-Gavras é um nome conhecido dos cinéfilos, se bem que não estimado por todos, dada a matéria que trabalha em quase todos os seus filmes: problemas políticos da actualidade numa perspectiva de esquerda. Não será, por isso, de admirar que a sua filha escolha para estreia na longa-metragem de ficção, tocar num tema da mesma ordem. Com a vantagem de o conhecer bem, por se tratar de matéria já abordada pelo pai num dos seus melhores filmes, Missing — O Desaparecido, sobre os «desaparecidos» após o golpe de Pinochet no Chile. Julie Gavras, porém, não aborda a questão de forma frontal, «distanciando-se» através da personagem de uma criança, onde, possivelmente, projectará algumas experiências pessoais. Por Culpa de Fidel é a história de Ana de la Mesa, filha de um espanhol exilado em França (interpretado por CStefano Accorsi, que foi o nosso Salgueiro Maia em Capitães de Abril) por ser antifranquista (mas o avô era um oficial de alta patente do Exército de Franco), roído por complexos de culpa pela morte do irmão, também opositor, e que encontra na experiência de Salvador Allende, no Chile, a oportunidade de se dedicar a uma «causa». Tanto ele como a mulher empenham-se de forma total na luta antifascista, participando em manifestações (contra a execução dos bascos da ETA, etc.) trabalhando activamente ao lado de militantes chilenos, sendo a segunda também activa militante do movimento pró-aborto em França. Por Culpa de Fidel (o título tem a ver com o que diz a criada da casa, cubana exilada) apenas se interessa por estes acontecimentos na medida em que eles se reflectem na pequena Ana, testemunha à força do movimento da história, como vão moldando o seu carácter e, também, como reflectem as contradições em que as próprias personagens caem, e que são bem conhecidas de quem compartilhou experiências semelhantes. Julie Gavras conta-nos todos os acontecimentos através do olhar de Ana, com as «confusões» em que ela se debate com o que as freiras lhe ensinam na escola e o que acompanha na vivência dos pais, e como isso afecta, inclusivé, a sua relação com as amigas da escola, e influencia e molda o seu carácter rebelde. A câmara está praticamente sempre ao nível do olhar de Ana (a sequência da manifestação de rua é particularmente sugestiva desta posição da câmara). Aquele mundo, que pertence ao passado, chega-nos transformado por um olhar inocente mas curioso e desejoso de saber o que acontece e o que são as coisas."M. Cintra Ferreira, Expresso de 13/07/2007
