Next - Sem Alternativa
Título original: Next
De: Lee Tamahori
Com: Nicolas Cage, Julianne Moore, Jessica Biel
Género: Acç, Thr
Classificação: M/12
Estúdios: Revolution Studios
EUA, 2007, Cores, 96 min.
"O Festival de Veneza viu este ano a versão «definitiva» (o «director’s cut», com a presença do realizador Ridley Scott) de Blade Runner — Perigo Iminente, que é a adaptação de um conto de Philip K. Dick, que talvez seja (pelo menos na opinião de um leigo como o que se assina) o melhor autor de ficção científica, ao lado de Ray Bradbury, embora, como o autor de The Martian Chronicles, a importância do escritor não se resuma a um género limitado ( ver texto nas páginas seguintes)."
"Se começamos por Blade Runner é porque o filme que se estreia esta semana, Next — Sem Alternativa, é também adaptado de um conto da autoria de Philip K. Dick, neste caso The Golden Man. O escritor tem estado nos últimos anos na atenção dos produtores (atenção que começou, infelizmente, apenas no ano da sua morte, em 1982). Os primeiros anos do século XXI (uma das fronteiras temporais na sua obra), viram a adaptação de, salvo erro, cinco das suas obras, a saber O Impostor, por Gary Fleder, em 2002, Relatório Minoritário, por Steven Spielberg, no mesmo ano, Pago Para Esquecer, por John Woo (2003), A Scanner Darkly (um singular projecto de animação de Richard Linklater), que entre nós apenas teve uma passagem no Indie deste ano, e Next. Mas a sua influência faz-se sentir também noutros filmes. É o caso, por exemplo, de Déjà Vu, de Tony Scott."
"Em termos de argumento, o filme de Lee Tamahori tem algo a ver com o de Scott e o Relatório Minoritário, de Spilberg (mais com o último, naturalmente, devido à comum origem literária). Como nestes, a história de Next anda à volta da capacidade de se conhecer o futuro e, deste modo, poder alterá-lo. Mas o que distingue Next dos outros dois, e lhe dá uma maior componente humana, é que, neste caso, a visão do futuro não resulta da mecânica, sim da mente humana. Mas há uma evidente ligação entre o filme de Spielberg e este: a capacidade de se «ver» o futuro em Relatório Minoritário é fruto do cérebro de jovens mutantes. De certo modo, o Chris Johnson (Nicolas Cage) de Next surge como uma espécie de «antepassado» dos mutantes de Speilberg."
"A origem da capacidade de ver o futuro de Johnson não é explicada, o que evita toda uma série de derivas desnecessárias à narrativa. Nasceu com aquela capacidade (limitada, pois a sua «visão» não ultrapassa os dois minutos do que há-de vir) o que o tornou um «fenómeno» estudado até à exaustão, até ele ter dito basta, e desaparecer. Johnson vive agora do seu trabalho como mágico num clube de Las Vegas e também de uma cautelosa exploração do seu talento secreto nas mesas de jogo dos casinos, evitando grandes apostas para não chamar a atenção."
"Os seus cuidados não evitam, porém, que o FBI comece a interessar-se por ele. E agora que a organização tem pela frente a ameaça de uma explosão nuclear em Los Angeles, tenta forçá-lo a pôr os seus dotes ao seu serviço, através da acção de uma das suas agentes (Julianne Moore)."
"Johnson, porém, tem outras ideias. Todos os dias, à mesma hora, encontra-se numa determinada cafetaria à espera de algo. Algo que se revelara para além dos habituais dois minutos, e que irá mudar o seu destino: a entrada da jovem Liz (Jessica Biel). Mas o destino dos dois parece estar ligado ao drama que se anuncia e Johnson irá tornar-se também objecto de caça dos sabotadores."
"A questão central de que o filme trata, que estava já presente no filme de Spielberg, é definida pelo próprio Johnson num momento central do filme: «Quando se começa a ver o futuro, este, por seu lado, começa logo a mudar», o que acaba por tornar imprevisível o sucesso das acções. É por entre estas opções que Johnson é forçado a trabalhar, o que, de certo modo, está em oposição ao que o título português do filme sugere: «sem alternativa». Só se por ele se entender que, faça-se o que se fizer, não há possibilidade de se ver o futuro de forma linear."
"O filme de Tamahori, que é sem dúvida o melhor trabalho americano do realizador neozelandês revelado com A Alma dos Guerreiros, é um muito bem equilibrado filme de suspense (mesmo que o termo aqui esteja, talvez, desajustado), que joga habilmente com a qualidade de Johnson de «ver» o futuro para alguns jogos de manipulação deveras curiosos, com momentos em que o espectador praticamente não se apercebe se está a ver a narrativa na sua forma linear ou se se trata do olhar «futurista». A confusão é bastante convincente no primeiro «encontro» de Johnson com a agente do FBI. Por outro lado, o «fenómeno» justifica também alguns momentos de bom humor, como a série de «encontros» alternativos, antes de Johnson se decidir a abordar a mulher dos seus sonhos."
Manuel Cintra Ferreira, Expresso de 08/09/2007