23.12.07

Call Girl
Título original: Call Girl
De: António-Pedro Vasconcelos
Com: Nicolau Breyner, Soraia Chaves, Ivo Canelas, Joaquim de Almeida
Género: Dra, Thr
Classificação: M/16
POR, 2007, Cores, 145 min.

"O cartaz era excelente, o «trailer» apelativo, mas Call Girl excede as expectativas. É que o filme mais sensual de todo o cinema português é muito mais que isso: é um retrato impiedoso e cínico deste nosso mundo, pondo o cinema português a falar de pessoas e de situações que sentimos existirem aí, na cidade, no país, agarrando a ideologia dominante. Acresce que Soraia Chaves explode a toda a largura do ecrã — e não apenas por causa dos atributos com que a natureza a dotou e os salões de beleza vão cuidando."

"Talvez ela seja, como se diz numa das falas do filme, a mulher que Deus queria ter — se fosse rico. Porque talvez o mundo da globalização e do capitalismo, enfim, triunfante seja como esta fita o descreve, em pinceladas categóricas e precisas: um lugar de trocas, comércios, traficâncias, transferências, um lugar pragmático onde já só velhos senis se lembram de combates para que tudo mudasse de raiz. E, por isso, nem Deus poderia ter Maria/Soraia Chaves sem esportular algo em troca."

"Call Girl é o primeiro filme português onde o sexo está radicalmente separado dos afectos — e onde se materializa, vencedora, a vertigem dos sentidos quando as relações humanas se despojaram do que lhes é essencial e só fica uma espécie de febre, de degraus que se escalam sem justificação outra para além do próprio acto de subir. Daí a linguagem, a rudeza das palavras que há-de ferir muitos ouvidos sensíveis, aqui usada quase como elemento de violência. Daí o calculismo da protagonista, o desamparo do homem que ela é contratada para enredar, pobre presidente de uma Câmara alentejana (grande interpretação de Nicolau Breyner, patético de ingenuidade), o próprio cinismo do agente da Judiciária que emprega um vago apelo amoroso para também ele a usar como isco. O mundo está desarranjado, não há volta a dar-lhe. O Mal vence, está na lógica das coisas."

"Call Girl é um filme irrepreensível, do ponto de vista da produção. A música de Luís Cília tem a suprema qualidade de funcionar sem se impor, e a fotografia de José António Loureiro o mérito da luz adequada. Mas ainda não foi desta que António Pedro Vasconcelos conseguiu a eficácia plena de argumento — o filme dura mais que as necessidades, há novelos que podiam ter sido decepados. Brilhou, todavia, na direcção de actores (fez de Soraia Chaves uma actriz e trabalhou todos os outros com proveito)."



"A fechar 2007, António Pedro Vasconcelos brinda-nos com um filme com todos os atributos para ser um êxito de bilheteira, história negra em que o crime compensa e não há justiça ou esperança que nos valha."
Jorge Leitão Ramos, Expresso de 22/12/2007