16.12.07

A História de Uma Abelha
Título original: Bee Movie
De: Steve Hickner, Simon J. Smith
Com: Jerry Seinfeld (Voz), Renée Zellweger (Voz), Matthew Broderick (Voz)
Género: Ani
Classificação: M/6
EUA, 2007, Cores, 90 min.

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"Para evitar confusões, diga-se desde já que, na nossa opinião, A História de Uma Abelha não está à altura de outras produções recentes da DreamWorks, como a série Shrek ou Antz, por exemplo. Dito isto, acrescente-se que o novo filme de Steve Hickner e Simon J. Smith, responsáveis, respectivamente, por O Príncipe do Egipto e a curta-metragem Shrek 4-D, é um trabalho divertido e não deslustra as tradições do estúdio criado por Steven Spielberg, aqui em colaboração com a Paramount. E muito menos a animação digital, que tem alguns momentos brilhantes."

"A História de Uma Abelha tem argumento de Jerry Seinfeld, o conhecido comediante de televisão que à escrita da história junta ainda a função de co-produtor, para além de dar a voz à personagem principal (na versão original, dando lugar a Nuno Markl na dobragem em português). E talvez seja esta presença (ou o seu peso no projecto) que marca a diferença, que se sente, em especial, no humor. De facto, seguindo a linha do estilo Seinfeld, o filme desequilibra-se ligeiramente do humor visual para o verbal, com as nuances que lhe são características. Isso é particularmente visível na longa sequência do julgamento (que nos parece, de facto, um pouco mais longa do que o necessário), mesmo com as habituais paródias e piscadelas de olho. Felizmente, o humor visual tem também um papel sugestivo nesta sequência, evitando que ela se torne aborrecida. Ora sendo um filme de animação, importa mais o que se vê do que aquilo que se ouve. Felizmente, o resto do filme consegue equilibrar as duas fórmulas, alcançando mesmo alguns momentos de excelência, como na sequência do voo do nosso herói pelo Central Park (e não é por acaso que foi esta a cena escolhida para a promoção do filme através da Internet)."

"Barry B. Benson (segundo declarações de Seinfeld, o nome do herói é homenagem a uma série de televisão que foi uma das suas primeiras aparições no pequeno ecrã) é uma abelha que, como todas as do seu enxame (e da sua espécie em geral) está destinada a trabalhar até morrer na cadeia de produção de mel. Mal saia da escola irá, com os seus condiscípulos, entrar na cadeia produtiva. Não se pode falar de «mercado» de trabalho, pois neste «sistema» todos o têm como garantido (Olá?! Que sistema económico é este?). Mas o nosso triplo B é bem um herói à americana. Daí que o bichinho da curiosidade o leve a interrogar-se sobre coisas que transcendem o mundo do trabalho. E, à saída da escola, aproveita uma «aberta» para dar uma escapadela, com o bravo e «másculo» esquadrão polinizador."

"Antes da aventura somos brindados com alguns momentos bastantes divertidos, com o nosso minúsculo herói na escola e algumas lições sobre os métodos com que os humanos se «defendem» dos insectos, do mata-moscas ou da revista dobrada (e a «Vogue» vai ter, mais tarde uma aplicação inesperada) e o pé. Segue-se a referida evasão, e esta, sim, é o grande momento do filme, com Barry acompanhando as acrobacias do «esquadrão», em voo de alta velocidade, com incidentes inesperados como o jogo de ténis que coloca Barry numa situação delicada ao ficar preso à bola. No meio destas peripécias, Barry vai dar a uma loja de flores, sendo alvo do ataque do irritado noivo da proprietária e salvo in extremis por esta. Quando Barry a vê é... amor à primeira vista!"

"Fiquemos por aqui no argumento do filme, para não tirarmos aos espectadores o prazer da descoberta. Basta acrescentar que Barry vai subverter os alicerces que desde sempre cimentavam a «relação» dos humanos com as abelhas, ao descobrir que os primeiros não fazem mais do que viver à custa das segundas no que a mel se refere, e em trabalho que se assemelha a «escravatura» (as colmeias). É ele que vai dar início à «revolta». Só que, como bom americano, Barry não recorre à violência revolucionária (como os Pássaros de Hitchcock?), apoiando-se nos tribunais para fazer valer os direitos do seu povo, processando, portanto, os humanos."



"Como se vê, o argumento tem muito que se lhe diga. Muitas ilações (bem mais humanas) se podiam tirar da sua história. Assim como a conclusão que acaba por ser uma espécie de «manifesto» pela fraternidade e colaboração, aqui entre as espécies. Mas talvez sejam estas «boas intenções» subjacentes ao argumento que marcam os seus limites. Felizmente, o humor e os desenhos evitam que se caia numa certa retórica a que alguns filmes de animação recentes não estão imunes (Pocahontas, por exemplo). Humor que recorre às habituais paródias cinematográficas (o famoso The Graduate/A Primeira Noite tem uma boa «citação», Ray Liotta é alvo de uma irresistível paródia) e a um elenco de luxo de vozes na versão original, que reúne, ao lado de Seinfeld e Renée Zelwegger, os nomes de Matthew Broderick, John Goodman, Chris Rock (num irresistível mosquito), a conhecida Oprah Winfrey no juiz e como convidado nada mais nada menos do que Sting."
Manuel Cintra Ferreira, Expresso de 15/12/2007