O Acontecimento
Título original: The Happening
De: M. Night Shyamalan
Com: Mark Wahlberg, Zooey Deschanel, John Leguizamo
Género: Dra
Classificação: M/12
EUA/Índia, 2008, Cores, 91 min.
Título original: The Happening
De: M. Night Shyamalan
Com: Mark Wahlberg, Zooey Deschanel, John Leguizamo
Género: Dra
Classificação: M/12
EUA/Índia, 2008, Cores, 91 min.
"ESTRANHOS fenómenos rodeiam a estreia do novo filme de M. Night Shyamalan. A começar pelo visionamento concedido pela Castello Lopes na manhã de quarta-feira, dia 11, apenas 24 horas antes da estreia mundial, numa altura em que a edição do «Actual» já estava encerrada. Tanto quanto nos foi possível apurar, a responsabilidade nem foi da Castello Lopes, que se limitou a seguir ordens da 20th Century Fox. Num filme de medos, quais foram os medos da Fox? Que a crítica demolisse o filme? Revelasse deste qualquer segredo? O semiboicote foi manobra de marketing? Correspondeu aos desejos de Shyamalan? Perante o seu filme mais irregular, mas também o mais livre dos últimos anos, não era caso para tanto sigilo."
"Passemos ao vento do título deste texto, às folhas das árvores do Central Park de Nova Iorque e à praga inexplicável que, numa bela manhã (podia ser a de um certo 11 de Setembro), desata a paralisar as pessoas. Pior: depois da paralisia, vêm as pulsões suicidas, que começam a varrer, pouco a pouco (e de árvore em árvore: diz-se que o mal vem das plantas), a população do Nordeste americano. O filme centra-se num casal em fuga, Elliot e Alma Moore (Mark Wahlberg e Zooey Deschanel), acompanhados de uma menor, a pequena Jess."
"E mais não contamos. Há coisas magníficas neste O Acontecimento. Propostas de cinemas incríveis de um cineasta que está-se cada vez mais nas tintas para «deixar mensagens». No limite, ele está-se nas tintas para o argumento: que haja pelo menos um assim na América. É claro que, quem quiser, pode encontrar aqui ganga metafórica e discursos sobre terrorismo, mas o filme recusa-os, pois é no território da fábula que nos encontramos, não perante um jogo de reconhecimento entre espectador e realidade, coisa proibida em Shyamalan. Aquela pele, ninguém pode vestir. A paranóia lançada pelos primeiros filmes de Shyamalan caminha agora para um silêncio inexpugnável, levando tudo consigo: o medo hitchcockiano e o choradinho do melodrama, o horror e o grotesco, as bases do cinema americano todo. As personagens, sentimo-lo neste filme mais do que nunca, estão numa posição em que podem desaparecer em qualquer momento, no contrapicado de corpos que caem de um prédio, no «travelling» de uma pistola que semeia cadáveres, na terrível imagem de telemóvel captada na jaula de leões de um zoo, na casa de uma velha feiticeira que Elliot, Alma e Jess encontram na floresta."
"Shyamalan está a trabalhar, intrépido, na fronteira do ridículo: isto parece-nos óbvio e não menos sublime. Um ridículo a dizer-nos, por exemplo, que ainda é possível acreditar num filme de terror feito com uma máquina de vento e uns desgraçados a fugirem sabe-se lá do quê. Mas lá que a coisa é fatal, é. Está tão bem filmada que só se pode acreditar nela. Já aquele final, caro M. Night, é um disparate ainda mais incompreensível que o teu filme: vamos acreditar que ainda estás a trabalhar nos anos 50 e que algum produtor da Fox, incrédulo com o que filmaste, te obrigou a fazer aquilo. Sabemos que não é verdade, caro M. Night, mas vamos acreditar nisso. Como nos teus filmes, tão diferentes de tudo o resto que se vê hoje."
Francisco Ferreira, Expresso de 21/06/2008