Título original: Hellboy II: The Golden Army
De: Guillermo del Toro
Com: Ron Perlman, Selma Blair, Doug Jones
Género: Acç, Ave
Classificacao: M/12
ALE/EUA, 2008, Cores, 120 min.
"ELE VEIO do reino dos infernos, criancinha, através de um portal aberto pelos nazis quando tentaram uma aliança com o próprio demo. Depois ficou por cá, mas, educado pelos bons ofícios de um professor, tornou-se um compincha — assim se provando quer a teoria do bom selvagem (não há rapazes nem demónios maus por natureza) quer a esperança de que a escola ou, pelo menos, os professores consigam moldar o carácter dos infantes e pô-los com tal igualdade de oportunidades que até um demónio pode ser agente especial do FBI. Hellboy poderá ter vindo das profundezas do Tártaro (e da BD, é claro), mas é apenas um adolescente desajeitado num corpo adulto, vermelho, muito forte e com duas protuberâncias córneas na cabeça, ou não fossem esses, tradicionalmente, os atributos de Belzebu. Além disso, tem uma vontade de protagonismo que põe em causa o óbvio secretismo com que as autoridades querem rodear a sua existência, pela-se por charutos cubanos e é casado com uma mulher literalmente inflamável. Como se percebe, Hellboy não é personagem para se levar a sério. Nem meio a sério. Ou alguém pode acreditar que há um demónio bom a combater pelo Governo americano? "
"Se a personagem não se pode levar a sério, é possível ir pelo lado da comédia. É o que está por detrás dos méritos quer do primeiro quer, agora, do segundo filme — Hellboy II: O Exército Dourado. A comédia e a visualização de qualquer coisa de mais fundo e inquietante que, a rir e a sorrir, lá vai passando mesmo assim. Já que aquele demónio é apenas um bom tipo numa dimensão que não é a dele, o realizador Guillermo del Toro aproveita o ensejo para deixar passar uma dimensão fantástica que pode ser maravilhosa, mas pode também meter muito medo (e eu acho que o ataque das fadas dos dentinhos traduzem bem isso). Como quem diz que não acredita nos monstros que povoam o escuro e acordam nos pesadelos, mas lá que eles existem, existem. E como quem acrescenta que esse lado oculto, esse imaginário fantasmagórico faz-nos imensa falta. É o melhor deste filme. Perdemo-nos no mercado dos «trolls» com mais gozo que no bar em Tatooine onde Obi-Wan Kenobi ia arranjar transporte no primeiro Star Wars; deleitamo-nos na mitologia das florestas — e naquele gigante arbóreo que é largado no asfalto para destilar ódio e fúria e que, no fim, se transforma, numa das sequências mais surpreendentes da fita — mesmo aceitando que a mensagem ecológica é metida às três pancadas. Olhamos o filme na bonomia de um universo fantástico que não quer ser mais do que, honestamente, afixa. Depois de O Labirinto do Fauno, verificamos que Guillermo del Toro continua a poder reivindicar um estilo. Aumentam as expectativas para The Hobbit, o regresso a Tolkien que ele tem em projecto. "
Jorge Leitão ramos, Expresso de 23/08/2008
Jorge Leitão ramos, Expresso de 23/08/2008