Ensaio Sobre a Cegueira
Título original: Blindness
De: Fernando Meirelles
Com: Julianne Moore, Mark Ruffalo, Alice Braga, Gael García Bernal
Género: Dra, Thr
Classificação: M/16
BRA/CAN/JAP, 2008, Cores, 111 min.
Título original: Blindness
De: Fernando Meirelles
Com: Julianne Moore, Mark Ruffalo, Alice Braga, Gael García Bernal
Género: Dra, Thr
Classificação: M/16
BRA/CAN/JAP, 2008, Cores, 111 min.
"É PROVÁVEL que Ensaio sobre a Cegueira seja um dos melhores romances de José Saramago. De certeza que é o mais difícil de ser adaptado ao cinema. Porquê? Porque é um livro onde o essencial decorre no interior dessa espécie de terror sem nome a que se chama cegueira branca, epidemia que ataca o mundo — salvo uma mulher — e produz o apocalipse, a desagregação da sociedade, o caos. Mas isso é dado de uma forma quase subjectiva, interior e o cinema é a arte da objectivação, da tradução em imagens."
"Sentir a cegueira e mostrar a cegueira não são a mesma coisa, são mesmo coisas antagónicas. Além disso, a cegueira é uma gigantesca metáfora e o cinema dá-se mal com metáforas, eu acho mesmo que deviam ser proibidas, a não ser que o realizador se chame Eisenstein. Saramago já vira a metáfora da península à deriva afundar-se no filme lamentável onde se adaptou A Jangada de Pedra. Com Ensaio sobre a Cegueira temia-se o pior. Daí que o desafio enfrentado por Fernando Meirelles fosse de monta."
"Espantem-se os cépticos: Meirelles conseguiu um equivalente fílmico tão próximo da respiração do romance quanto é possível. Sobretudo na zona de mais problemática adaptação (toda a parte que decorre no interior do campo de concentração dos «doentes» quando a desagregação da decência humana é rápida pela instalação de relações de hierarquia e de poder), consegue fazer com que a imagem se desligue da fatalidade naturalista e crie (por efeitos de rarefacção cromática, de excessiva proximidade, de alguma deriva), uma sensação de anarquia, de sufocante apodrecimento da realidade. Por outro lado, sempre que objectivou o caos — estou a lembrar-me dos planos abertos na cidade devastada, com os cegos em anárquica deambulação —, Meirelles suporta um outro alento, muito diferente do pânico da anarquia que invade a maior parte da fita."
"A objectivação tem o peso de um requiem — e é quase um lamento sobre o fim de uma certa beleza civilizacional que Ensaio sobre a Cegueira deixa transparecer. Adaptar uma peça maior da literatura é sempre um empreendimento que não se recomenda. No melhor dos casos, costuma dar lugar a divagações caprinas, como na anedota de Hitchcock sobre se é melhor o filme ou o livro. E hão-de ficar sempre ressentimentos a medrar num sítio qualquer. Não aqui."
Jorge Leitão Ramos, Expresso de 15/11/2008