9.12.08

Fome
Título original: Hunger
De: Steve McQueen
Com: Michael Fassbender, Stuart Graham, Helena Bereen
Género: Drama
Classificação: M/16
GB/IRL, 2008, Cores, 96 min.

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"O CINÉFILO distraído poderá confundir o nome do realizador de com o de um actor americano muito popular falecido em 1980 e cuja imagem ainda hoje é utilizada na publicidade. Nada disso. Este Steve McQueen é um premiado artista, de instalações de fotografia e filme, nascido em Londres em 1969, e que se estreia agora na realização com uma obra que se impõe, desde já, como uma das mais importantes do ano. O argumento de Fome é, simultaneamente simples e trágico. Simples na sua forma narrativa utilizando um estilo que se poderia chamar de minimalista, trágico na sua história."

"O estilo austero usado por McQueen lembra muito o de um mestre do cinema francês, Robert Bresson, e a sua obra-prima Fugiu Um Condenado à Morte, em especial na portentosa sequência de abertura, com o seu despojamento total de qualquer dramatismo e diálogo, o tom quase documental com que mostra os gestos da higiene matinal de um homem, que depois veremos ser um guarda prisional, a atenção da câmara aos pequenos sinais que revelam a sua profissão e estado de espírito (os nós dos dedos feridos, que mais tarde percebemos resultarem da tortura de um preso), e as imagens frias e secas, montadas de forma directa sem artifícios deformadores."

"Este estilo vai manter-se na exposição do tratamento que na prisão de Maze, na Irlanda do Norte, se aplicava a alguns militantes do IRA, neste caso nos começos da década de 80 do século passado quando o conflito não declarado se tornava mais duro devido à política de Margaret Thatcher. É só ao fim de cerca de meia hora que o filme encontra um personagem central. Até então parece uma série de quadros dantescos. As pinturas de Francis Bacon saltam-nos à vista, em especial na cela em que se encontram dois presos «não cooperantes» (exigência de tratamento como presos políticos e recusa de vestir o uniforme dos presos comuns), com as paredes «pintadas» de excrementos pelos presos como forma de protesto contra aquela situação. Essa personagem é Bobby Sands (uma fabulosa e impressionante composição de Michael Fassbender), militante do IRA que, no momento em que o encontramos é arrastado pelos guardas para ser brutalmente «limpo», a fim de receber uma visita. Para sair do impasse em que se encontra a luta que travam contra a instituição prisional, Bobby e os seus companheiros vão entrar em greve de fome ilimitada, até ao sacrifício supremo."

"A segunda parte do filme centra-se quase exclusivamente no seu sacrifício e na progressiva degenerescência do seu corpo (a que o actor dá um realismo impressionante). Sequências quase sem palavras que dizem mais do que muitos discursos. E entre elas, entre a austeridade inicial e a descida aos infernos do fim, uma pasmosa cena, um plano-sequência de mais de dez minutos com o diálogo entre Sands e o padre, e a discussão ética e moral sobre o acto de Sands."



"Uma obra-prima incontornável."
Manuel Cintra Ferreira, Expresso de 06/12/2008