17.1.09

O Estranho Caso de Benjamin Button
Título original: The Curious Case of Benjamin Button
De: David Fincher
Com: Brad Pitt, Cate Blanchett, Tilda Swinton
Género: Drama, Romance
Classificação: M/12
EUA, 2008, Cores, 166 min.

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"O PRETEXTO para a história até se diria destinado a alimentar piadas de mau gosto: Benjamin é um humano que parece programado a viver ao contrário. Nasce velho e esclerosado, bebé mostrengo: a mãe não resiste ao parto, o pai leva-o para longe de casa e abandona-o na escada onde uma jovem mulher negra namora. Recolhido por um sentimento de solidariedade, Benjamin cresce e rejuvenesce. Lá para o fim, com 80 longos e bons anos de vida — e o corpo de um recém-nascido —, há-de entregar a alma ao criador como quem adormece na paz do último suspiro."

"Mas o argumentista Eric Roth (o mesmo de “Forrest Gump” e de “Munique”), em vez de se deleitar em explorar as curiosidades do fenómeno, avançou para um lugar de espanto: pôs o filme a reflectir sobre um dos grandes mitos românticos — o momento perfeito em que dois humanos encaixam de corpo e alma, e a isso chama-se amor. Normalmente, os filmes dedicam-se a fazer as personagens chegar lá ou demoram-se na degradação, nunca na perenidade de um sentimento (é que se um amor dura sem drama não há nada a contar e não há filme)."

"O que “O Estranho Caso de Benjamin Button” tem de mais peculiar é sabermos, pela lógica da cronologia, que a óbvia história de amor desenhada entre as personagens de Benjamin e de Daisy (sensivelmente da mesma idade) só pode acontecer num certo momento e não pode durar. (Mas há um instante justo, um momento certo?) A angústia da transitoriedade é uma espantosa trouvaille do filme (a transitoriedade é própria de ser-se humano, nós é que nos recusamos a acreditar; a lógica da fita confronta-nos com a inelutabilidade)."

"Todavia, a história de amor dura, mas desenhando contornos onde a felicidade não entra: e o filme convoca sentimentos ásperos, como a renúncia ou a dedicação sem retorno esperado. Em verdade vos digo: terá uma pedra no peito quem não se comover com a enorme sabedoria dos afectos (e não só na história de amor central: veja-se o segmento com Tilda Swinton, admirável)."

"O resto é a magnífica arte de contar histórias que o melhor cinema sempre há-de ser — com muitos e bons actores e grande fantasia —, aqui recorrendo ao que de mais prodigioso a técnica e a indústria nos podem oferecer. Não há que poupar louvores à excelência das maquilhagens, ao génio dos efeitos digitais, à competência dos directores de arte que nos fazem viajar ao longo de quase um século como se as coisas, as casas, os fatos, os penteados, os adereços, as guerras estivessem lá e fosse só filmá-los. Ou como se as rugas no rosto ou as carnes flácidas nas costas de Cate Blanchett fossem obra de Deus. É isso que explica os 150 milhões de dólares que o filme custou (e dificilmente os financiadores vão ter de volta)."

"Abençoada seja a loucura de David Fincher (e os balanços das duas majors sobre as quais vai recair o prejuízo), pois esta fita é uma daquelas coisas que nos põe de bem outra vez com o cinema, já que nos lembra porque é que nos empolgamos tanto com esta coisa de imagens a mexer num grande ecrã. É que um filme pode ser uma espécie de aconchego para a banalidade do quotidiano, pode ser bigger than life e ter toda a vida dentro. Assim é “O Estranho Caso de Benjamin Button”."



"Corram a vê-lo, não há muitos com este brilho e alma."
Jorge Leitão Ramos, Expresso de 17/0172009