8.4.09

Che - Guerrilha
Título original: Che: Part Two
De: Steven Soderbergh
Com: Benicio Del Toro, Rodrigo Santoro, Demián Bichir
Género: Drama, Guerra
Classificação: M/12
ESP/EUA/FRA, 2008, Cores, 131 min.

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"O MITO GUEVARA não começa na Sierra Maestra, mas quando ele se torna um profeta e um mártir da Revolução, isto é, quando abandona o conforto do poder conquistado em Cuba e se mete pelo mundo fora, a praticar a máxima de criar um, dois, mil Vietnames, desafiando as condições objectivas da História e as próprias directrizes oficiais do comunismo internacional. E nesse gesto jogando tudo, incluindo a sua vida que imola a qualquer coisa de difuso e grandioso, um amanhã sem exploradores nem explorados. Qualquer coisa que a realidade lhe nega, tragicamente, depois de, em Cuba, ter triunfado contrariando todas as probabilidades."

"Duas semanas após a estreia da primeira parte do épico de Steven Soderbergh — onde a luta em Cuba estava no centro — estreia agora a outra face do díptico — em que é o tempo da guerrilha na Bolívia que está em foco."

"A segunda parte pode-se ler como a curva descendente de um arco em que a tomada do poder em Havana estivesse no zénite (e, deveras, nunca vemos esse momento, nem na primeira nem na segunda parte). De um lado a ascensão, do outro o mergulho no abismo — em qualquer deles a História sendo-nos apresentada como Guevara a viu, já que o argumento segue de perto os relatos que deixou escritos. E sempre sem nenhuma prosódia a propor uma qualquer expansão seja da fé seja do império. Se há aspecto verdadeiramente singular nesta fita é que é o primeiro épico que conheço em que o herói nunca se perfila ante o horizonte a dizer-nos uma mensagem entusiasmante."

"Pelo contrário: o herói é dado a uma escala humana e impenetrável. Contrariando os cânones do cinema de Hollywood, Soderbergh nunca nos familiariza com Guevara, não toca no ombro do Che. Olha-o, segue-o, respeita-o, admira-o — mas não o desvenda, não traduz em miúdos as suas razões, as suas relações de amizade ou de mais fundo sentimento (nada saberemos dos seus amores, por exemplo). Não o psicologiza, não o explica. Deixa o mistério pairar — como se o personagem fosse um Cristo a percorrer um calvário (e nós a saber que nenhum Pedro edificou qualquer igreja a partir da sua paixão...)."



"O trabalho de Benicio Del Toro (além de protagonista co-produtor da fita) é, aliás, de um total desapego pois quase esconde o seu perfil de vedeta reconhecível por detrás dos disfarces ou do retrato icónico, cada vez mais humano e patético, filmado por Soderbergh com a nervosidade de uma reportagem e a distância de quem tem quatro décadas de permeio. E, todavia, grande é o poder envolvente deste filme em que um dos ícones pop do século XX acaba por nos dizer, por ínvios caminhos, que talvez a utopia, um dia, esteja aí."
Jorge Leitão Ramos, Expresso de 04/04/2009