Título original: La Caja
De: Juan Carlos Falcón
Com: Ángela Molina, Elvira Mínguez, Antonia San Juan
Género: Comédia
Classificação: M/12
ESP/POR, 2006, Cores, 107 min.
"COM QUASE três anos de atraso chega-nos o filme de estreia na longa-metragem de Juan Carlos Falcón, uma co-produção luso espanhola, em que a participação portuguesa, a cargo de José Mazeda, se limita, no elenco, à participação de Rogério Samora, no papel de um pescador. Pouco se faz notar, e ainda bem, porque o filme é intrinsecamente espanhol e, neste campo, retoma o espírito (e a saudável provocação) de mestre Luis García Berlanga. Deste ponto de vista, “La Caja — Quatro Mulheres e Um Morto” constitui uma das mais agradáveis surpresas do ano. É humor ‘negro’ puro, excessivo, truculento, ‘esperpêntico’ (como diriam ‘nuestros hermanos’, num termo intraduzível), onde a Morte é outra personagem de farsa, invisível, mas presente no cadáver que está a ser velado."
 "Numa aldeia de uma das ilhas Canárias, no começo da década de 60 do século passado, morre um homem. O filme começa no hospital com um médico de ar compungido a dar a notícia à viúva, Eloisa (Ángela Molina). O cadáver é transportado para a casa desta, para o velório, mas devido à exiguidade da habitação, é levado para o apartamento de uma vizinha, Isabel (Elvira Mínguez), casada com um pescador ausente, com um filho e uma irmã prostituta, Benigna (Antonia San Juan, a inesquecível travesti de “Tudo sobre a Minha Mãe”, de Almodóvar). Mas o defunto não era um homem qualquer. Don Lucio era a pessoa mais odiada da ilha. Franquista ferrenho, era o ‘bufo’ da aldeia aproveitando o seu papel para fazer chantagem, especialmente sobre as mulheres dos outros, de quem abusava e violava e mantendo a sua praticamente enclausurada. Com a sua morte, o pesadelo parece ter terminado. Um dos primeiros gestos de Eloisa vai ser arrancar as tábuas que fechavam a janela de onde, antigamente, via o mar, e deixando o cadáver em casa da vizinha, vai, pela primeira vez em muitos anos, a um cinema onde se projecta um filme com o seu ídolo Jorge Negrete (mais tarde irá encontrar, num vizinho, quase a materialização do seu ídolo)."
"Numa aldeia de uma das ilhas Canárias, no começo da década de 60 do século passado, morre um homem. O filme começa no hospital com um médico de ar compungido a dar a notícia à viúva, Eloisa (Ángela Molina). O cadáver é transportado para a casa desta, para o velório, mas devido à exiguidade da habitação, é levado para o apartamento de uma vizinha, Isabel (Elvira Mínguez), casada com um pescador ausente, com um filho e uma irmã prostituta, Benigna (Antonia San Juan, a inesquecível travesti de “Tudo sobre a Minha Mãe”, de Almodóvar). Mas o defunto não era um homem qualquer. Don Lucio era a pessoa mais odiada da ilha. Franquista ferrenho, era o ‘bufo’ da aldeia aproveitando o seu papel para fazer chantagem, especialmente sobre as mulheres dos outros, de quem abusava e violava e mantendo a sua praticamente enclausurada. Com a sua morte, o pesadelo parece ter terminado. Um dos primeiros gestos de Eloisa vai ser arrancar as tábuas que fechavam a janela de onde, antigamente, via o mar, e deixando o cadáver em casa da vizinha, vai, pela primeira vez em muitos anos, a um cinema onde se projecta um filme com o seu ídolo Jorge Negrete (mais tarde irá encontrar, num vizinho, quase a materialização do seu ídolo)." "Também os vizinhos rejubilam. Jorge (Vladimir Cruz) pode, finalmente, surgir à luz do dia sem receio de represálias, assim como o irmão, uma das vítimas de Don Lucio. E às mulheres irá caber a vingança mais requintada. Numa série de cenas, onde o macabro se alia ao burlesco, constituindo alguns dos melhores momentos de humor negro numa cinematografia tão rica nele como a espanhola, o cadáver de Don Lucio será alvo de duas macabras ‘profanações’, ambas respostas a outros tantos crimes de que ele fora responsável sobre as mulheres. E estas são apenas algumas das atribulações por que passa o cadáver, com um enterro verdadeiramente inenarrável."
"Também os vizinhos rejubilam. Jorge (Vladimir Cruz) pode, finalmente, surgir à luz do dia sem receio de represálias, assim como o irmão, uma das vítimas de Don Lucio. E às mulheres irá caber a vingança mais requintada. Numa série de cenas, onde o macabro se alia ao burlesco, constituindo alguns dos melhores momentos de humor negro numa cinematografia tão rica nele como a espanhola, o cadáver de Don Lucio será alvo de duas macabras ‘profanações’, ambas respostas a outros tantos crimes de que ele fora responsável sobre as mulheres. E estas são apenas algumas das atribulações por que passa o cadáver, com um enterro verdadeiramente inenarrável." "Entretanto, um conspícuo habitante da aldeia informa Eloisa da existência de uma importante soma de dinheiro escondida por Don Lucio. Mas embora a viúva comece a sua busca, o que lhe importa é a liberdade recém-adquirida. Como noutros filmes do género, um destino inesperado espera pelo dinheiro."
"Entretanto, um conspícuo habitante da aldeia informa Eloisa da existência de uma importante soma de dinheiro escondida por Don Lucio. Mas embora a viúva comece a sua busca, o que lhe importa é a liberdade recém-adquirida. Como noutros filmes do género, um destino inesperado espera pelo dinheiro."
"“La Caja — Quatro Mulheres e Um Morto” é uma irresistível metáfora sobre o franquismo, sobre a repressão odiosa exercida sobre um povo e os ódios latentes que esperam pela sua oportunidade. A não perder."
Manuel Cintra Ferreira, Expresso de 25/04/2009
Manuel Cintra Ferreira, Expresso de 25/04/2009
 

 
