6.7.09

Elegia
Título original: Elegy
De: Isabel Coixet
Com: Sonja Bennett, Patricia Clarkson, Penélope Cruz, Ben Kingsley
Género: Drama, Romance
Classificacao: M/12
EUA, 2008, Cores, 108 min.

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"ELE É UM professor universitário com uma perninha na rádio e outra na televisão, comentador cultural suficientemente abrangente para saber bastante de literatura, um tanto de arte e de música, teatro também, evidentemente. David (Ben Kingsley) já ultrapassou a meia-idade, diz coisas como quem revela o mundo — tem tudo para fascinar as alunas que ele, aliás, escolhe, com a paciência de um gourmet que não se importa de esperar horas até que o cozinhado chegue ao ponto, até que o vinho abra por inteiro. Desenvolveu, ao longo dos anos, uma técnica de sátiro e uma regra: nunca fazer a aproximação antes do fim das aulas, das pautas afixadas, dos trabalhos universitários concluídos. Convida então todos os discentes para uma festa em sua casa e lá para depois da meia-noite é certo que há-de estar a mostrar uma reprodução de Velásquez ou um manuscrito de Kafka à aluna que foi enredando, intermédios que o nosso homem — cínico avisado — entende necessários para fazer durar o tempo antes do vamos ao que interessa: fornicação. Nada de laços afectivos, apenas carne e suor, espasmos, a doce despreocupação da libido à solta, sem afectos, sem compromissos, nada na manga. Um dia foi casado, abominou."

"Até que Consuela (Penélope Cruz), uma capitosa cubana, rapariga de família, lhe aparece à frente, livre. E David começa a sentir ciúmes, sentimentos de posse, o amor agarrado ao peito — e a reagir como um adolescente inseguro, embora teimoso. Entre o cinismo e o desamparo, David não é, muito claramente, capaz de gerir as coisas que o atravessam. Tudo se complica mais ainda quando um filho adulto que o odeia desde que o pai deixou a mãe lhe aparece, também ele perdido numa confusão entre uma amante e uma esposa. Ou quando o seu melhor amigo morre de repente, deixando-o sem arrimo emocional."



"“Elegia”, que a catalã Isabel Coixet foi buscar a uma novela de Philip Roth (“O Animal Moribundo”), é um filme que manipula os fios com que se fazem os sentimentos mais essenciais da teia da vida para nos fazer perceber que, na “Maja Desnuda” (ou em Penélope Cruz), é provável que a maioria olhe para os seios, mas há que nunca esquecer os olhos. Todavia, são as duas coisas juntas que formam o que é capital (como se demonstra na longa panorâmica sobre o corpo nu da actriz, deitada depois do amor, ou o plano com as lágrimas, sublime). Edifica, em especial, uma sensibilidade muito particular, uma espécie de recato que faz da licenciosidade do protagonista um estado de alma, não um convulsão física. Para tanto usa a câmara com contenção e concede aos seus actores a primazia. Penélope Cruz, antes de mais, que talvez já não tenha idade para parecer uma estudante universitária, mas tem tudo o que é necessário como actriz para a complexidade que o seu papel exige. Ben Kingsley, logo a seguir, que leva o seu David debaixo do braço com a naturalidade de ser um dos maiores actores do nosso tempo. Mas também Dennis Hopper, no poeta amigo de David que com ele partilha o cinismo sobre as relações com o sexo oposto. Ou Patricia Clarkson, espantosa actriz num personagem fulcral, o de Carolyn, amante eventual de longa data que David ‘engana’ com Consuelo, a provar que os caminhos dos processos da conjugalidade aparecem onde menos se espera." Jorge Leitão Ramos, Expresso de 04/07/2009