16.11.09

Os Sorrisos do Destino
Título original: Os Sorridos do Destino
De: Fernando Lopes
Com: Ana Padrão, Rui Morrison, Milton Lopes
Género: Drama
Classificação: M/12
POR, 2009, Cores, 98 min.

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"ADA É UMA MULHER cosmopolita, entre lançamentos de livros, programas de rádio, viagens a Itália e Wagner como música de fundo. Borboleta cultural, é natural que, aqui e ali, ceda às seduções que os artífices do gosto tão hábeis são a manusear. Do amor não saberemos o que pensa, mas o sabor da infidelidade está no rosto de Ana Padrão e cai-lhe bem. Carlos, o marido, pelo contrário, é um jornalista muito mais terra-a-terra, ao espavento sinfónica prefere os boleros de Los Panchos (espantosa banda sonora a desta fita — onde se compra?) e acerca do amor só sabemos que nunca há-de conseguir viver sem Ada. Rui Morisson é esse homem, seguro de si e, todavia frágil que, um dia, lê uma mensagem no telemóvel da mulher, por acaso, por artes do destino — ele que nem tem nem é capaz de manusear tais aparelhos. Descobre que há um tal Manuel B. que anseia por voltar a estar com ela. E resolve conhecer esse outro parceiro que andava pela sua vida e ele nem sonhava. Escritor angolano, em casa isolada, de excelente gosto e melhor vinho, Manuel é Milton Lopes (que já em “O Delfim” era o homem que a senhora ia buscar). O que Carlos encontra e como resolve aquilo que encontra não cumpre dizer aqui, vão ver o filme. Convém saber, contudo, que ele leva no bolso uma navalha de ponta e mola, mas que esta não é uma fita de faca e alguidar."

"“Os Sorrisos do Destino” é uma situação triangular tão antiga quanto a humanidade, contada com um sorriso nos lábios e um injúria no peito. Sagaz, o filme começa por uma alusão em subtexto (uma sessão fotográfica com uma top model em lingerie) onde o sexo se afixa com exuberante evidência, para depois o apagar quase por inteiro, como se esse fosse um assunto para o domínio do não-dito. Corajoso, enfrenta o pânico da solidão sem medo do ridículo naquela outra cena em que Carlos se levanta pela noite fora, sem norte nem rumo, e acaba acalentado pelo amigo que o mete na cama e lhe ajeita os lençóis, paternalmente — cena de uma verdade sem manejos, exemplar. Sofisticado, resolve-se numa espécie de encenação de alma grande, como se os comparsas masculinos fossem homens do mundo e soubessem sorrir perante os adejos das mulheres, os seus enlevos e enganos. Mas não sabem. No fundo há qualquer coisa de marialva por ali. Até no abandono a que Ada está votada."



"Existe, no mais recente filme de Fernando Lopes, uma vontade de olhar as agruras dos sentimentos — o adultério, os cansaços, os jogos de sedução — com a leveza nobre dos cínicos amargos do cinema (Lubitsch, Wilder, evidentemente). Constatemos, no entanto, o ponto de vista excessivamente masculino para que se verifique a equanimidade que esses mestres sempre se esforçavam por praticar. E, à falta da arte da esgrima com que desembrulhar diálogos e situações, notemos que sobra uma ibérica consternação: boleros em que se pode marinar a dor de corno, temperada a álcool — whisky ou tinto (do Douro) — e tristeza. Quase quase à beira das lágrimas. (Eu acho que a câmara desviou o olhar um segundo antes de acontecer. Questões de pudor, não temos nada com isso). Os filmes de verdade também têm direito a zonas reservadas." Jorge Leitão Ramos, Expresso de 14/11/2009