13.4.10

As Ervas Daninhas
Título original: Les herbes folles
De: Alain Resnais
Com: André Dussollier, Sabine Azéma, Emmanuelle Devos, Anne Consigny
Classificacao: M/12
FRA/ITA, 2009, Cores, 104 min.

Photobucket

"HÁ UM NARRADOR que começa a contar uma história e, às vezes, se detém, hesita, inflecte, como se a história pudesse ir para onde melhor conviesse, como se não existisse real algum a que a narração tivesse de assentar — e, logo aí, “As Ervas Daninhas” faz acordar as campainhas dos que gostam que o cinema não ande à trela de qualquer coisa fora dele. Entretanto, há Marguerite, uma mulher de cabeleira flamejante que vai comprar uns sapatos de que não precisa e a quem roubam a carteira, e ela nem se exalta muito. E há Georges, um homem que encontra essa carteira no chão de um parque de estacionamento e a vai entregar na polícia, mas esse homem fantasia saber como Marguerite é, e vê-la, e estar com ela, e... Mas, aqui para nós, quem é ele? Quem é esse Georges Palet que a primeira vez que lhe desagrada a atitude de um seu concidadão evoca a hipótese de... o matar? E que recusa sentir-se seduzido pelas ninfas que passam, com medo... de quê? O que faz, de que vive? Será que saiu da prisão? Será que tem um buraco negro no seu passado, uma ponta, quem sabe, de loucura? Será isso? Não o cárcere por delitos criminais, mas o manicómio, o asilo de alienados... Mas, então, será que também aconteceram crimes no caminho do manicómio? E porque é que há uma esposa que continua a viver com ele, a protegê-lo como a uma criança inofensiva? E será que toda aquela obsessão vai desembocar numa história de amor? Ou num desfecho de morte violenta?"

"Perguntas, perguntas, perguntas — e num registo de comédia, de puro divertissement, Resnais leva-nos, filme fora, não tanto presos pela vontade de saber uma história, mas no gozo da própria narrativa a construir-se, conscientes de que não há mais nada para lá disso e, todavia, mesmo assim, sentindo emoções fortes. Mais uma vez, Resnais prova que o que conta, em matéria de envolvimento emocional, não é a suspensão da consciência da convenção, não é a aceitação da representação como se fosse o real. Neste filme, estamos sempre cientes de que se trata de um filme, e não é por isso que as cordas das emoções são menos dedilhadas."



"É um mundo artificial, que se pinta com cores que não há, que tem movimentos de câmara ‘impossíveis’ (como fazia Hitchcock) e requintes de cenografia de estúdio a fingir que não se dá conta, mas dá (paradoxalmente, há décors reais que são filmados para parecer estúdio e, aqui e ali, temos dúvidas) — porque o que Resnais ama não são histórias, são os mecanismos com que elas se constroem. E é extraordinário como, 50 anos depois de “O Último Ano em Marienbad”, a lógica é ainda a mesma. Só que nesse mágico e sublime filme distante, o formalismo assumia-se como um ritual frio. Em “As Ervas Daninhas”, tudo estremece lá por dentro, de riso, medo, ternura, inquietação. Quanto aos actores, sobretudo à sagrada dupla André Dussollier/Sabine Azéma (quase obrigatória no cinema de Resnais desde há muitos anos), é extraordinária a paleta que utilizam para dar intencionalidade às inúmeras coisas que ficamos por saber neste filme literalmente encantador." Jorge Leitão Ramos, Expresso de 10/04/2010