11.11.10

A Rede Social
Título original: The Social Network
De: David Fincher
Argumento: Aaron Sorkin
Com: Jesse Eisenberg, Andrew Garfield, Justin Timberlake, Armie Hammer, Max Minghella, Josh Pence
Género: Drama
Classificação: M/12
Estúdios: Columbia Pictures, Scott Rudin Productions, Trigger Street Productions
EUA, 2010, Cores, 116 min.

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"No princípio do filme, um rapaz e uma rapariga falam, à volta de uma mesa. Falam, sim, mas não conversam, trocam palavras de um modo peculiar, por frases bruscas, às vezes com afirmações definitivas, sem verdadeira troca de argumentos. Ele, em particular, é um tipo tão metralhante e assertivo que, depressa, a miúda se farta e nós com ela. Ele sai, então, para o quarto da residência universitária onde vive para logo a insultar num blogue que, no dia seguinte, toda a gente há de ter lido. Ela fica tão humilhada que nunca mais quer saber dele. Pouco depois, ele põe-se a inventar a primeira rede social, pirateando fotografias das alunas de Harvard e pondo a malta a votar qual era a mais boazona. Sucesso instantâneo. É assim, desta forma supinamente elegante, que germina a maravilha maior da nossa idade — o Facebook."

"Aaron Sorkin, o argumentista de “A Rede Social”, não gosta, manifestamente, de Mark Zuckerberg que, em meia dúzia de anos, passou de marrão em Harvard para o mais jovem bilionário do mundo. E David Fincher é quase desapiedado na forma como filma o guião de Sorkin, sem particular fascínio pelo seu protagonista e deveras alarmado quanto ao estado do mundo. É deste ponto de vista (Zuckerberg como herói, o Facebook como sintoma) que o filme se pode considerar um capital reflexo do nosso tempo — e uma reflexão sobre os valores civilizacionais que por aí estão. E não é só Zuckerberg a viajar no barco. Em particular é perturbante a entrada (e a saída) de cena de Sean Parker, o feiticeiro da informática que, aos 16 anos, foi condenado como hacker e, aos 20, inventou o Napster e ficou rico, o homem que, deveras, transformou as ideias de Zuckerberg num fenómeno global. E não menos impressivo é o clima frenético em que tudo acontece, com Zuckerberg a fazer crer que trabalha para os irmãos Winklevoss e a passar-lhes a perna, apoiado no pequeno investimento do amigo Eduardo que mais tarde há de apunhalar, empurrado pela volúpia de poder do homem que, com o Napster, dera cabo de uma indústria planetária e transformara o mundo inteiro numa legião de recetadores da pilhagem. Em simultâneo, há valores financeiros que se multiplicam por potências de dez todos os meses. Tudo isto contado em tempo descronologizado: uma narrativa principal cruzada com cenas dos processos em que Zuckerberg foi tendo de responder face aos amigos que foi traindo, sempre em nome de um incremento do negócio e de um egotismo tão frio que faz parecer Charles Foster Kane (de “O Mundo a Seus Pés”, de Orson Welles) um sentimental. Com outra diferença importante: a fortuna de Kane tinha na origem uma mina de ouro, correspondia a um bem palpável — assim era a economia dos anos 30; a de Zuckerberg é feita de bits e conexões (sonhos, ideias?), é virtual, e só existe porque há milhões de pessoas a gastar milhões de horas a expor-se num ecrã, a clicar numa tecla de computador e a contabilizar quantos ‘amigos’ conseguiram. Ou seja, é um valor volátil — como muita da economia deste princípio do terceiro milénio."



"Fincher engrena um filme onde a teia se constrói a uma velocidade que faz parecerem curtas as duas horas de “A Rede Social”. É um trabalho de uma perícia considerável, sobretudo porque o protagonista só lhe interessa enquanto indício e não há qualquer herói alternativo. Tudo culmina na devastadora imagem final: Zuckerberg, indescritivelmente rico, famoso criador da última coqueluche da Rede, sozinho numa sala de reuniões, com um portátil sobre a mesa... O círculo fecha-se. A solidão tem o tamanho do mundo." Jorge Leitão Ramos, Expresso de 06/11/2010