18.1.11

Complexo - Universo Paralelo
Título original: Complexo - Universo Paralelo
De: Mário Patrocínio
Género: Documentário
Classificação: M/12
BRA/POR, 2010, Cores, 80 min.

Photobucket

"Ainda há poucas semanas a atenção do mundo esteve focada num ataque policial aos traficantes entrincheirados no Complexo do Alemão, uma das mais problemáticas favelas do Rio de Janeiro. Coincidência temporal feliz para um documentário ainda quente dos acabamentos, todavia filmado nos últimos meses de 2007, depois de um período de gestação de mais dois anos, primeira obra de um novo realizador português, Mário Patrocínio."

"“Complexo — Universo Paralelo” tem a sua origem nas filmagens de um videoclip de Mc Playboy, um cantor funk da favela, filmagens onde Mário e o seu irmão Pedro colaboraram e que lhes abriu o contacto com a realidade dessa comunidade nos arrabaldes da Cidade Maravilhosa. “Essa realidade era tão diferente da que eu conhecia”, disse-nos o realizador, “que senti que ali havia qualquer coisa que merecia ser mostrada e sobre a qual se devia refletir”. Em 2005, os dois irmãos passaram o Natal no Complexo do Alemão, “para ter material de pesquisa e para conhecermos aquela realidade de forma diferente. É que uma coisa é nós irmos lá e voltarmos para casa ao fim do dia, outra muito diferente é passarmos a dormir no local. Nessa altura fizemos uma série de entrevistas filmadas, como pesquisa, e de um leque de trinta personagens chegámos às quatro que estão no filme. Com isso montámos um pequeno teaser e começámos a procurar produtores e financiamentos”. Debalde, já que ninguém queria pôr dinheiro num filme onde nem sequer era certo que eles saíssem de lá vivos. Na verdade, as notícias sobre os confrontos entre a polícia e os bandidos eram constantes, o que tornava altamente improvável que o filme alguma vez se fizesse. Mas muitos desses produtores que fecharam as portas ao financiamento abriram-nas quanto a contactos ou facilidades de cedência de material. De maneira que Mário e Pedro Patrocínio acabaram por ser eles mesmos os financiadores do documentário. “Juntámos o dinheiro que tínhamos ganho em vários trabalhos no Brasil, vendemos um carro pequeno que lá tínhamos com seis ou sete anos e foi assim que fomos filmar”. Com o filme concluído a Valentim de Carvalho Multimédia torna-se distribuidor e a SIC adquire os direitos para televisão em aberto e torna-se media partner.



"O filme centra-se em quatro protagonistas, Dona Célia, mãe de família com oito filhos para sustentar e a pensão de um deles, deficiente, como única fonte regular de receita; Seu Zé, presidente da associação de moradores, que tenta zelar pelos mínimos de salubridade e segurança num lugar onde uma e outras estão perto do inferno; Mc Playboy que fora a porta de entrada para aquilo tudo; os traficantes, o verdadeiro poder do Complexo do Alemão, que, filmados sempre numa obscuridade que torna indetetáveis os seus traços, acabam a narrar os termos em que encaram a atividade criminosa. Com tudo isto, “Complexo — Universo Paralelo” é um filme em que a brutalidade das condições de vida nos arrasa o olhar numa primeira impressão (o lixo, a promiscuidade, as indescritíveis condições de pobreza — faz medo ver aquela vastidão de construções precárias e pensar que ali sobrevivem 300 mil pessoas), mas onde o olhar do realizador pouco mais além desse embate de choque penetrou. Com efeito, no que será o seu pecado maior, o filme não consegue estabelecer uma corrente energética empática com qualquer dos protagonistas, de modo a que a audiência se sinta a partilhar da sua existência. Pelo contrário, há uma exterioridade, por vezes mesmo a sensação de um olhar clandestino, contrabandeado, com a câmara ao nível da cintura em caminhadas pelos tugúrios que vai encontrando. Oportunidade gorada para um grande mergulho numa realidade social que grita e nos interpela? Sem dúvida. Mas “Complexo — Universo Paralelo” é também cartão de visita positivo de um novo realizador que se apresenta com a força de quem quer ter uma voz e não está à espera que todas as condições ótimas lhe sejam fornecidas, antes avança, suja as mãos e persevera. E isso é uma qualidade sem preço." Jorge Leitão Ramos, Expresso de 15/01/2011