7.1.11

Tulpan
Título original: Tulpan
De: Sergei Dvortsevoy
Argumento: Sergei Dvortsevoy, Gennadi Ostrovsky
Com: Askhat Kuchinchirekov, Samal Eslyamova, Ondas Besikbasov, Tolepbergen Baisakalov
Género: Comédia, Drama
Classificação: M/12
ALE/Cazaquistão/ITA/POL/RUS/SUI, 2008, Cores, 99 min.

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"A estreia inesperada — e já um pouco tardia — de “Tulpan” nas salas portuguesas (o filme foi visto pela primeira vez em Cannes 2008 e venceu, de resto, a secção Un Certain Regard dessa edição) convida-nos a retrospetivar a obra do realizador cazaque Serguei Dvortsevoy, que conhecemos desde os seus documentários dos anos 90, “Paradise”, “Bread Day” e “Highway”. Ex-engenheiro, durante nove anos, da companhia aérea russa Aeroflot antes de entrar na prestigiada escola de cinema VGIK, Dvortsevoy, nascido em 1962, deixou marca com aqueles três filmes (uma curta e duas médias-metragens), que correram mundo através dos festivais e lhe valeram um certo estatuto de culto. Dvortsevoy é um daqueles documentaristas que gosta de dar tempo ao tempo, em rodagens extremamente longas que lhe permitem descobrir o que há de poético e metafísico nos gestos do quotidiano; um cineasta em busca de uma força telúrica (algures entre um Flaherty e um Paradjanov), sensível ao ciclo da vida e da morte, e que jamais se esgota no fenómeno social que tem à sua frente — e o que Dvortsevoy tem à sua frente, de um filme a outro, é o dia a dia do povo cazaque que é o seu, imagens da vida tradicional das estepes do país, e um efeito de humor trágico da realidade pós-soviética que brota naturalmente, pela sua graça."

"Para Dvortsevoy, “Tulpan” representou outra coisa: sair do gueto dos documentários e abraçar uma ficção com atores não profissionais. O espaço é o da Ásia Central, no Cazaquistão desértico e profundo. E o tempo é o de um regresso a casa, o de Asa (Askhat Kuchencherekov), jovem cazaque que acabou de passar uma temporada a servir na marinha russa e agora volta para os seus, para seguir com a vida. Estamos num registo familiar com homens solitários e lacónicos e mulheres amaldiçoadas e inacessíveis. O nosso Asa tem queda para sonhador e fanfarrão. Enquanto descreve o que é um cavalo-marinho aos seus pares, eles que só têm por companhia uma fauna de ovelhas e camelos, vai passando o tempo na companhia da irmã, cunhado e filhos destes, que o suportam enquanto ele não casa. A alavanca dramática do filme vem precisamente daqui, do casamento. É que, para Asa, a única noiva possível num raio de centenas de quilómetros chama-se Tulpan, a tímida rapariga que passa o tempo a esconder-se e dá título ao filme. Asa, que não cai nas graças da hipotética noiva, tudo fará para sair vencedor da conquista e da maçada que significa ser solteiro naquelas bandas. Está preso a um círculo vicioso, a uma realidade que gira à volta de si própria e que só tem fim no horizonte. E é neste enquadramento vagamente exótico e novelesco, tão novelesco que até recorda “A Cartuxa de Parma”, que nasce também no filme uma hipótese de melodrama, permeável à comédia e ao burlesco."



"Com “Tulpan”, é certo que caminhamos por terrenos world (também há um world cinema, no mesmo sentido em que se fala da world music), febris e pitorescos: contado assim, parece coisa para turista. Contudo, a experiência de documentarista de Dvortsevoy vai permitir-lhe sair de um ritmo que se temia anedótico e histérico. “Tulpan” não alimentará o seu folclore em potência. A sequência do nascimento do cordeiro está lá também para isso, para pausar a ação e encontrar outro ritmo que melhor espelhe e se ajuste aos sortilégios desta fábula sobre o amor, o desejo e o desapontamento." Francisco Ferreira, Expresso de 01/01/2011