31.7.11

Super 8
Título original: Super 8
De: J.J. Abrams
Com: Elle Fanning, Amanda Michalka, Kyle Chandler
Género: Thriller, Ficção Científica
Classificação: M/12
Outros dados: EUA, 2011, Cores, 112 min.

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"Para quem segue o cinema americano das últimas três décadas, e para quem o segue e pertence a uma determinada geração, não faltará quem pense que filmes como “Super 8” estavam perdidos para sempre. Que não se fariam mais, eternamente presos a uma época maravilhosa do cinema americano que, nos anos 80, sonhou mais do que qualquer outra. Não foi uma época de ouro, essa, a que recebeu aliens, super-heróis, vilões intratáveis entre outros que tais, conquistados nas salas e nos clubes de VHS — mas nos anos 80, no cinema, tudo foi possível. Há quem ainda se lembre. Nenhuma outra década sonhou tanto, nem nos anos 20 em que se filmavam zepelins. Nenhuma foi tão demente. E a infância, nesse tempo e nesse cinema, ainda era um segredo. A magia adormeceu entretanto. O cinema sofisticou-se, julgamos que se tornou mais difícil, embora tudo à sua volta pareça ter contribuído para o facilitar (o digital, por exemplo). Mas não vale a pena perdermos tempo com isso. Ah, mas há a infância. A que tem a cor branca das origens e causa dores de estômago. Que foi feito dela? Cada um chora pelo que já perdeu. Nos anos 80, talvez a infância tenha tido o seu derradeiro sabor a transgressão. Esse desejo do medo e do escuro, de descer a grutas profundas. Não se vê — ou só muito raramente se vê — isso hoje, sobretudo lá pelas bandas dos estúdios de Los Angeles. Mas não é por causa do aqui e do agora que “Super 8” veio ao mundo."
"Estamos em 1979, numa cidadezinha (inventada) do Ohio. Um rapaz, Joe (Joel Courtney), chora num baloiço de jardim, coberto de neve. Morreu-lhe a mãe (num acidente), o pai (Jackson/Kyle Chandler) é o xerife da zona, o drama é sentido. E a melancolia não vem de uma panóplia de efeitos especiais, de umas falcatruas atiradas para os olhos, mas dos olhos desse miúdo, forçado a adaptar-se à orfandade — e da orfandade dos anos 80 fala também este filme. Quatro meses passam, o gelo derrete. Joe tem amigos, e um deles, Charles, decide fazer um filme de escola (e de zombies) no formato do título. Alice (Elle Fanning), a miúda mais gira da escola, fará parte do elenco. Não vamos contar muito mais do que isto. Apenas que Joe ainda guarda a foto da mãe num medalhão e que esta história de filiações rompidas, para o aqui produtor Spielberg (que mergulhou a fundo neste projeto) — ele que, mais do que ninguém, se bateu para deixar à infância uma porta aberta em Hollywood —, é uma velha preocupação. Mas J.J. Abrams, não melhor nem pior do que Spielberg, vai dar a esta história spielberguiana até à medula outro ritmo e outra emoção. Acrescente-se ainda que, quando o filme dos miúdos começa, a rodagem ‘tropeça’ nuns caminhos de ferro e que por lá passa um comboio que descarrila por causas que depois saberemos, enquanto a câmara continua a filmar sozinha. É um comboio fantasma, literalmente. Traz lá dentro uma criatura alienígena. É o pânico na cidadezinha. O Exército toma conta de tudo. A prova está na película. E, nesse comboio, fundem-se a ficção científica e o teen movie e materializam-se os fantasmas das crianças, os filmes que eles viram e os que eles sonham fazer, como se “Super 8” fosse uma espécie de chamamento a que o cinema decide dar resposta e consolo: sim, é possível."



"“Super 8”, que fala de cinema acima de tudo, não deixa de ser o filme de todos os riscos e de todas as misturas de géneros, e mais triunfante se torna a sua expressão quando consegue finalmente resolver a embrulhada, mantendo as baterias apontadas à emoção. Embora pareça estar a mascar o melhor de Spielberg, de Carpenter, de Dante e de McTiernan, “Super 8” consegue sair vivo da sua própria trituradora — e ser genuíno. Pensamos sobretudo na dificuldade da representação do monstro, cujas formas se vão descobrindo aos poucos (como no tubarão de Spielberg), e no seu confronto com Joe naquele magnífico final. Para a criança, o monstro não será jamais a realidade de uma representação antagonista. Antes uma manifestação de fé na ficção, pois o que Joe vê no alienígena é a memória da mãe que ele perdeu. “I know bad things happen. But you can still live!” Quando o luto nos é dado assim num filme, e pela boca de uma criança, podemos acreditar nele de olhos fechados." Francisco Ferreira, Expresso de 30/07/2011