16.11.11

Sem Tempo
Título original: In Time
De: Andrew Niccol
Com: Amanda Seyfried, Justin Timberlake, Cillian Murphy, Vincent Kartheiser
Género: Thriller
Classificação: M/12
Outros dados:
EUA, 2011, Cores, 109 min.

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"Marx sustentava que a paga dos proletários era o mínimo necessário para que eles mantivessem e reproduzissem a força de trabalho. Andrew Niccol leva isso à letra no seu último filme, “Sem Tempo”. Passa-se num próximo futuro não tão diferente da atualidade que seja preciso gadgets, veículos ou mesmo indumentárias particulares para criar um efeito de real. A grande disparidade vem do facto de, nesse futuro, os humanos terem sido clonados, sendo-lhes incorporado um relógio no antebraço. Até aos 25 anos, tudo decorre sem incidentes de maior, nascem, crescem, desenvolvem-se e vivem. Mas, no dia em que esse prazo se completa, o relógio ativa-se, num estremecimento de passagem à idade adulta. A partir de então, o relógio entra em contagem decrescente — e só lá tem um ano para gastar. Para se prolongar a vida é preciso trabalhar — os salários são pagos em horas creditadas nesse relógio irrevogável — ou roubar. Ou, então, deter meios de produção, ser empresário, banqueiro, pertencer à casta dirigente. Esses, ao apropriarem-se da mais-valia das massas que correm e desesperam para sobreviver, têm um capital de séculos ou de milénios, podem ser virtualmente eternos. Para tornar as coisas mais problemáticas para os de baixo, os de cima criaram dois mecanismos de manutenção do status quo: controlam os preços, os juros, o valor dos produtos e da mão de obra (os chamados mercados), de modo a manter os trabalhadores sempre no limiar da pobreza, à beira da morte; e criaram portagens entre os locais onde vivem os pobres e aqueles onde vivem os ricos, anos que os de baixo nunca conseguem acumular para poder, ao menos, espreitar a riqueza dos outros."

"A partir do momento em que o relógio se ativa, nunca mais se envelhece, toda a gente tem a aparência de 25 anos — as filhas são iguais às esposas, iguais às mães, iguais às amantes, matéria para infinitas variações ficcionais. E, se há quem queira viver para sempre, mesmo depois de ter muitos anos e ter visto, gozado e sofrido o bastante para duas ou três vidas (numa ganância insaciável), também há quem se canse e queira partir. No princípio do filme, há um rico desiludido que passa mais de um século ao protagonista antes de se suicidar. Este resolve, então, atravessar as portagens, sair do gueto, ir até ao mundo dos ricos, tirar-lhes tudo o que têm."



"Andrew Niccol é um cineasta visionário que criou universos tão originais como os de “Gattaca” (1997), “Simone” (2002) ou “A Vida em Directo” (1998, este dirigido por Peter Weir). Nos territórios de ficção que vem criando, a opressão e a liberdade têm sido os invariáveis temas, em diferentes cambiantes, mas sempre apelando ao inconformismo, quando não ao combate aberto, perante os poderes. Mas nunca criara uma metáfora tão fremente sobre a luta dos homens pela sua sobrevivência — no fundo, a grande energia que nos move. Infelizmente, a excelente ideia que preside a “Sem Tempo” é apoucada pelos constrangimentos do filme de ação. Entre assaltos, perseguições e pulsões suicidárias (notável é o polícia no encalço do herói e da sua dama, interpretado com um brilho mecânico no olhar por Cillian Murphy), “Sem Tempo” ainda aflora o perfume de “Pedro, o Louco” ou de “Bonnie e Clyde”, não tendo, todavia, nem a poesia nem a vontade de apocalipse desses filmes sulfúreos. Um dos mais originais filmes do ano acaba, assim, por se esboroar nas convenções do cinema para os adolescentes consumirem. Sinal dos tempos." Jorge Leitão Ramos, Expresso de 12/11/2011