2.12.12



Cloud Atlas
Título original: Cloud Atlas
De: Tom Tykwer, Andy Wachowski, Lana Wachowski
Com: Tom Hanks, Halle Berry, Jim Broadbent, Hugo Weaving
Género: Drama
Classificação: M/12
Outros dados: Hong-Kong/SIN/EUA/ALE, 2012, Cores, 172 min.


"“Cloud Atlas” não é só um filme megalómano à imagem dos seus autores. É também uma experiência bizarra da indústria que levou quatro anos a ser financiada, na Alemanha e em paragens mais longínquas como Hong Kong e Singapura. Resultado: um filme independente de 100 milhões de dólares (!), feito à margem dos estúdios, embora distribuído pela Warner Bros. Dentro de “Cloud Atlas”, a bizarria não acaba. De um episódio a outro, e naquela estrutura incomum, cada ator principal terá direito a seis metamorfoses, a uma personagem por cada um dos seis episódios, alimentando um continuum em que a história não só se torna incontinente como deixa de ter um centro percetível. Mais, essa falta de centro permite ao espectador (e este é um ‘dano colateral’) ‘abandonar’ “Cloud Atlas” ao longo da projeção, pois outros filmes se atravessam forçosamente enquanto vemos este: não é convocado o cinema de piratas clássico de Hollywood no segmento do século XIX?, não é no cinema de blaxploitation que pensamos ao longo do segmento da jornalista nos anos 70?, não é “Avatar” que vem à memória no episódio pós-apocalíptico? Para todos perde a síntese de “Cloud Atlas” em comparação. O que nos deixa à porta deste filme, contudo, é outro aspeto — e ele não é novo nos Wachowski. Tal como “Matrix”, “Cloud Atlas” fala-nos de indivíduos isolados que lutam à sua maneira para escaparem da tirania da natureza humana. Indivíduos que descobrem que podem sonhar com a liberdade, como a personagem da empregada de restaurante coreana, clonada geneticamente."

 "Acontece que os Wachowski não resistem a propor-nos uma espécie de ‘corrente espiritual’, sugerindo que os homens, de mãos dadas, estão unidos entre si e pelo Cosmos, num canto de aleluias que espera por um sinal de esperança e nos convida a pensar na reencarnação eterna. Mensagem de retórica pura? Se o filme fica longe de convencer-nos como um todo, há coisas a reter. Alguns dos raccords que nos permitem passar de um tempo a outro, como se atravessássemos várias janelas de teletransportação, são sainetes eficazes na narrativa que vão mantendo em suspenso a atenção do espectador. As personagens de Ben Whishaw, ele que é um dos melhores atores da sua geração, distinguem-se das demais (sobretudo do registo monocórdico de Tom Hanks). Aqui e ali, e tal como em “Speed Racer”, encontram-se boas ideias soltas que a estrutura sinfónica desta obra tão estranha dilui sem delas tirar particular proveito. Um filme de remendos?, de mixed feelings? Não somos futurólogos nem sabemos se daqui a 20 ou 30 anos se falará do cinema dos Wachowski, se este culto é sólido ou efémero. Não sabemos se o tempo, que é o maior e o mais improvável dos juízes, encontrará nesta obra desígnios mais profundos que nela não vemos. Se tal acontecer, “Cloud Atlas”, mais do que a trilogia “Matrix”, surgirá então no primeiro plano." Francisco Ferreira, Expresso de 01/12/2012