15.12.12



O Hobbit: Uma Viagem Inesperada
Título original: The Hobbit: An Unexpected Journey
De: Peter Jackson
Com: Martin Freeman, Ian McKellen, Richard Armitage, Elijah Wood, Cate Blanchett, Andy Serkis, Christopher Lee, Hugo Weaving
Género: Aventura
Classificação: M/12
Outros dados: Nova Zelândia/EUA, 2012, Cores, 166 min.


"A saga “O Senhor dos Anéis”, de J. R. R. Tolkien, é composta por três grossos volumes que deram origem a três longos filmes — com todo o sucesso que sabemos. Obra mágica, a inventar uma cosmogonia e uma geografia humana criadas de raiz, “O Senhor dos Anéis” (livro) fascinou — e há de continuar a fascinar — gerações atrás de gerações, porque o seu imaginário é de tal maneira absorvente e totalizante que nenhum humano lhe pode ficar indiferente. O mesmo se dirá da trilogia cinematográfica de Peter Jackson, felicíssima figuração do universo tolkiano."


"“O Hobbit” é um volume magro, pouco mais do que um conto, que Tolkien escreveu muito antes de empreender “O Senhor dos Anéis” e é uma espécie de antecâmara à famosíssima saga, sem a sua incomensurável ambição. Vai dar origem a uma trilogia no cinema com dimensão idêntica à anterior (o filme de abertura tem 169 minutos de duração) — ou seja, acrescentando muita parra à uva da história de Tolkien, como “O Hobbit: Uma Viagem Inesperada” abundantemente testemunha. Claro que nos é grato reencontrar algumas das figuras de “O Senhor dos Anéis” — como Gandalf (Ian McKellen), Saruman (Christopher Lee), Elrond (Hugo Weaving), Galadriel (Cate Blanchett) ou Frodo (Elijah Wood), muito brevemente, além de Gollum (Andy Serkis), que domina uma das melhores cenas do filme. Claro que, fãs da saga, não ficamos indiferentes à revisita do universo de Tolkien com os seus seres fantásticos, um humor britânico muito particular (a cena em que os trolls discutem a forma de cozinhar os anões capturados é exemplar) e uma inventiva visual que faz jus ao passado do realizador.Mas esse sentimento de reencontro com um lugar onde se foi feliz cedo cede o passo ao tédio pela ausência de fôlego dramatúrgico e narrativo que agora se testemunha."


"“O Hobbit: Uma Viagem Inesperada” é quase só uma sucessão de correrias e combates — como se os seus comparsas estivessem constantemente “a saltar da frigideira para o fogo”, como se diz, aliás, no próprio filme —, concebidos com uma desmesura espacial que é mais própria do cinema de animação do que da imagem real. Perde-se qualquer capacidade de identificação do espectador com os protagonistas da aventura, com a consequente quebra do laço emocional que a eles nos deve ligar. Um exemplo maior deste facto é a fuga do interior da montanha dos gnomos, com os combates em pontes precárias, quedas de precipícios abissais — para no fim de tudo estarem todos ilesos e com fôlego bastante para fugir ao bando de orcs que logo a seguir os persegue com vontade de carnificina. Sem descanso, são colocados em situação desesperada, só resolvida porque Gandalf manda chamar o bando de águias gigantes, que os leva rapidamente dali para fora."


"A completa inverosimilhança da sequência, a correria em que tudo decorre, acorda em nós a sensação de tanto-faz e origina que, deveras, nem queiramos saber da coragem, dos medos e dos perigos de todos aqueles seres que não podem ser feitos de carne, mas apenas de papel pintado ou nem isso - bitts num ecrã. A febre de não deixar que nada pare nem que seja por minutos tem outra consequência. A própria beleza cenográfica das cidades, das montanhas, dos abismos - como o horror fisionómico dos orcs e o negrume das antros onde se albergam as criaturas do mal - não encontra tempo para que a contemplamos, afundando-se na voragem."

"Nada disto obstará a que este regresso de Jackson a Tolkien seja um êxito nas bilheteiras: há milhões de pessoas a quererem vê-lo, nem que seja para não jurar falso." Jorge Leitão Ramos, Expresso de 15/12/2012