Por Manuel Silva
Álvaro Cunhal era uma figura histórica do PCP, desde há cerca de 70 anos. Foi fundamental na reorganização do Partido no início dos anos 40, tendo afastado o grupo de Virgílio de Carvalho e Cansado Gonçalves, bem como o operário Francisco Paula de Oliveira (Pável), secretário-geral interino entre 1941 e 1942.
A partir daí, mesmo antes de ser eleito secretário-geral em 1961, era ele o líder na prática.
Santiago Carrillo, líder histórico dos comunistas espanhóis, afirmou que quando Cunhal entrava numa reunião do Komintern, era como se entrasse Suslov, o principal ideólogo do PCUS.
Álvaro Cunhal era mais importante para os soviéticos que muitos comunistas então no poder.
Publicou diversos livros. Era também bom desenhador e pintor. Nas suas obras estava sempre presente o seu sectarismo ideológico.
Muitos jovens da sua geração aderiram aos ideais comunistas por generosidade. A Revolução de Outubro era uma esperança para muita gente bem intencionada.
Só que, tal revolução e todas as posteriores revoluções comunistas terminaram em ditaduras e falharam na economia, precisamente no sector onde Marx dizia ser o capitalismo inferior à colectivização por si preconizada no "Capital", no "Manifesto do Partido Comunista" e em outras obras da sua autoria. Muitos dos revolucionários que acompanharam Lenine foram mandados assassinar por Estaline, como foram os casos de Trotsky, Zinoviev, Buharine, a quem Lenine apelidou de "filho querido do partido" e tantos outros. O mesmo aconteceu na China, na Albânia, em Cuba, na Hungria e tantos outros países. Álvaro Cunhal sempre soube de tudo. Como souberam comunistas honestos que abandonaram os seus ideais ao conhecerem o "socialismo real", como foram Francisco Ferreira (Chico da CUF), Silva Marques, Cândida Ventura e tantos outros.
Vitor Cunha Rego, já falecido, afirmou há cerca de 20 anos que Salazar e Cunhal eram duas árvores que brotavam da mesma cepa. A cepa da recusa da democracia pluralista e do parlamentarismo. Salazar já não viu desabar o mundo em que acreditou. O mesmo não aconteceu com Cunhal, o qual assistiu ao fim da URSS, à queda do muro de Berlim e à passagem da maioria dos partidos comunistas a sociais-democratas. Manteve-se fiel ao seu ideário de sempre. Coerente foi, sem dúvida. Homem dotado de rara inteligência e grande nível cultural e intelectual também, mas alguém a quem a História negou razão. É o que acontece a quem defende utopias revolucionárias que esbarram com as "massas" concretas, chegando a cair na amoralidade, em nome de um ideal. É que, como diz um velho ditado, "de boas intenções está o inferno cheio".
PS: Ontem, no "prós e contras", a dissidente do PCP e actual militante e deputada do PSD, Zita Seabra, afirmou que aquando da sua expulsão, Cunhal lhe disse: "nunca mais serás ninguém". Ao ouvi-la, lembrei-me do último encontro que tive com o meu "controleiro" no PCTP/MRPP, que me afirmou "o Comité Central decidiu considerar-te um inimigo. Estás proibido de entrar em sedes e demais instalações do nosso partido. Nunca mais dirijas a palavra a qualquer um de nós. Ninguém te fala mais". Estas atitudes são habituais em todos os partidos comunistas, com o objectivo de assustar quem sai. Relativamente a mim, a ameaça não resultou.
Pouco depois, o meu "controleiro" também abandonava o partido. Hoje, somos, de novo, bons amigos. Se leres isto, Carlos (vou tratar-te pelo pseudónimo da época), sabes que é verdade.
Também a ti, Paulo, que ainda fazes parte da direcção do PCTP/MRPP, apesar de estares de relações cortadas comigo, aproveito para te agradecer a defesa que fizeste de mim quando fui "julgado" sem me poder defender .