22.11.09

Tetro
Título original: Tetro
De: Francis Ford Coppola
Com: Vincent Gallo, Maribel Verdú, Alden Ehrenreich
Género: Drama, Mistério
Classificação: M/12
ARG/ESP/EUA/ITA, 2009, Cores e P/B, 127 min.

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"HÁ UM JOVEM que procura um irmão mais velho que anos antes se foi embora da casa paterna. Há um pai com tendências centrípetas, fazendo o mundo convergir para um ponto onde ele está. Há uma história trágica com ressonâncias de incesto e há uma jovenzinha fascinada que um pai rouba a um filho e depois se desarticula, como uma boneca a quem partiram as ligações. Há um tipo que praticamente enlouquece com a história da sua vida que não pára de escrever e mastigar — e uma mulher que o salva sem lhe matar os fantasmas. E há Coppola a dizer que todas aquelas histórias, personagens, relações, tramas e traições são verdadeiras, embora nada daquilo alguma vez tenha ocorrido."

"Já estou a ver, daqui a poucos anos, os biógrafos do realizador debruçados sobre “Tetro”, tentando esclarecer em cada recanto uma correspondência com a realidade, como se este fosse um filme com chaves para decifrar. Acrescento já que quero, no futuro, ler esse esforço, mas que, perante o filme, isso é o que menos me interessa. Pelo contrário, interessa-me muito verificar que esta espécie muito particular de saga familiar, em tom de melodrama embalado pelo som do bandoneón (fascinante banda sonora de Osvaldo Golijov), tem o sopro de uma ópera popular. É por isso que nenhum dos personagens é verdadeiramente realista e que a fotografia a preto-e-branco cria uma impressão de sufoco como eu não via desde “A Saudade de Veronika Voss” de Fassbinder (quem diria que já passou mais de um quarto de século!)."

"É por isso que as ruas do bairro de La Boca, numa Buenos Aires apaixonante e onírica, parecem cenários de um palco incomensurável, como pareciam as de “Do Fundo do Coração” que eram mesmo feitas num estúdio, as de “Tetro” não. É por isso que quando Maribel Verdú dança diante de um Alden Ehrenreich que não podia estar mais embevecido, aquilo parece um momento perfeito e a gente nem se interroga sobre os cordéis de ficção que ligam a cena ao que veio antes e ao que vem depois. Não: a gente fica ali, mais enfeitiçada do que o protagonista, sem querer saber mais nada a não ser a pura beleza diante dos olhos."

"E apetece que dure — infindavelmente. Como nos melhores filmes de Powell e Pressburger que Coppola explicitamente convoca, como nas grandes árias de Verdi que desejamos que não acabem nunca, “Tetro” é um objecto com o poder de retorsa sedução que só os pináculos artificialistas conseguem destilar. Tem tudo lá dentro, Eros e Thanatos, espantos, dores, bailado, a grande música, o teatro mais delirante, a tragédia, os espaços largos (como nos westerns), o melodrama da ralé, faca-e-alguidar, e a melhor arte elitista — até tem uma cena de iniciação sexual feita com uma alegria tão exuberante que apetece ser virgem outra vez. Esta massa infrene, pulsante, é caldeada pela mão de um autor que sabe tudo o que há para saber sobre cinema e que, como já nada tem a provar, faz aqui o mais livre dos seus filmes, o mais secreto, o mais barroco, um dos mais belos."



"(Tenho um amigo que acha Francis Ford Coppola o maior cineasta da História do Cinema. “Tetro” — e a trilogia dos Padrinhos, e “Apocalypse Now” e “Do Fundo do Coração” — quase me fazem dar-lhe razão.)" Jorge Leitão Ramos, Expresso de 21/11/2009