O Meu Amigo Eric
Título original: Looking for Eric
De: Ken Loach
Com: Steve Evets, Eric Cantona, Stephanie Bishop
Género: Comédia Dramática
Classificação: M/12
GB, 2009, Cores, 117 min.
Título original: Looking for Eric
De: Ken Loach
Com: Steve Evets, Eric Cantona, Stephanie Bishop
Género: Comédia Dramática
Classificação: M/12
GB, 2009, Cores, 117 min.
"Quando me disseram que o último realizador marxista do hemisfério ocidental — Ken Loach, como se sabe — fizera um filme com Eric Cantona e por ele co-produzido, a minha primeira reacção foi de desalento. Seria que, cumprido o cabo dos 70 anos, Loach se deixara, enfim, seduzir pela mundaneidade e pelo futebol? Teria ele trocado a denúncia das injustiças pelos golos do Manchester United (os Reds, mas mesmo assim...), teria traficado a luta de classes pelo pontapé no hooligan (gesto que fez quase tanto pela notoriedade de Cantona quanto as jogadas geniais, pois não há maior fama que a infâmia)? Confesso que a bizarria atraiu a minha curiosidade e, se essa foi a estratégia de Loach — bingo!"
"“O Meu Amigo Eric” é a história de um carteiro adepto do Manchester United a quem a vida corre bastante mal. Não propriamente pelo emprego: este não é um filme sobre relações laborais. O que acontece é que o carteiro quer fazer alguma coisa para reconquistar Lily, a mulher que ama perdidamente — e a quem abandonou há muitos anos com uma filha nos braços — e não há meio de acertar com a estratégia. Ele acha mesmo que é uma refrega perdida à partida. Além disso, a segunda mulher abandonou-o, deixando dois filhos adolescentes lá em casa — e nenhum é filho de Eric. Os rapazes estão fora de controlo, a coisa mais benevolente que fazem é fumar uns charros e ver pornografia, enquanto a loiça suja se acumula na cozinha, objectos presumivelmente roubados aparecem aqui e ali, até uma betoneira, calcule-se..."
"É neste caos, onde só as alegrias doadas pelos Reds ao povo de Manchester dão para carregar o fardo da existência, que é preciso invocar alguém que ajude a guiar a vida. Podia ser o anjo da guarda, a Senhora de Fátima, ou o Batman. Eric invoca Eric Cantona — e ele vem. E explica ao seu homónimo, naquele seu jeito de falar por aforismos, que é preciso um bocadinho de ganas e de ousadia, de imaginação e de autoconfiança. Claro, uma boa preparação física é essencial. E, sobretudo, espírito de equipa. É assim que, quando um dos enteados de Eric se mete em trabalhos com um pequeno gangster local, vai ser a malta dos correios, unida (e com máscaras de Cantona), que lhe mostra como se faz uma camisa de onze varas."
"Um dos aspectos mais curiosos do filme é que, de facto, Eric Cantona não faz de Cantona. Ele interpreta antes a imagem que um homem de meia idade do povo de Manchester faz de Cantona — e nisso há já uma saborosíssima auto-ironia por parte do ex-futebolista, a sagacidade de dar a ver uma distância entre imagem-de-marca e realidade, permanecendo esta, está bom de ver, privada."
"Ken Loach e o seu fiel argumentista Paul Laverty (há dez filmes que trabalham juntos) conseguem tecer uma ficção tonificante e surpreendente, onde há uma aguda atenção social, uma comédia romântica e um genuíno amor pelo futebol — daquele que faz olhar uma jogada de Cantona como um ballet ao sol. E amor pelas pessoas, o que é um pouco mais tocante: veja-se o retrato daquela família esquartejada por erros imbecis (que Loach praticamente nos diz que são co-naturais à condição humana), os assomos de solidariedade, os arranques de energia que não chegam para mudar o mundo, mas vão arranjando uma coisa aqui, outra ali. E, com um bocadinho de sorte, pode ser até que apareçam uns velhos sapatos de camurça azul que alguém que nos ama não conseguiu deitar fora." Jorge Leitão Ramos, Expresso de 13/02/2010